Manaus, 18 de maio de 2024

A fundação da Colônia 13 de Maio no Cambixe

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*Antônio Carlos Marinho Bezerra

A seca que assolou o Ceará nos anos 1877 a 1879, e posteriormente a seca dos “três oito”, iriam influenciar sobremaneira o povoamento do Careiro, mais precisamente a região do Cambixe, para onde os cearenses, baldados todos os esforços do governo para permanecerem em sua terra natal, foram encaminhados pelo presidente da Província ao Amazonas, onde deveriam dedicar-se à agricultura, promover o desenvolvimento econômico do lugar e, afinal, proporcionar-lhes melhores condições de vida, objetivo primordial que deu ensejo à fundação da colônia.

A Colônia do Cambixe foi inaugurada no dia 9 de maio de 1889 pelo presidente da Província, Joaquim de Oliveira Machado, com o nome de “Treze de Maio”.

O jornal Amazonas, que circulou no dia 12 de maio de 1889, estampou:

Colônia 13 de Maio

No dia 9 do corrente foi inaugurada a colônia “13 de Maio” por su. Exc. O sr. dr. Oliveira Machado que seguiu desta capital no vapor Acre para o Careiro, local da colônia, acompanhado de sua exma família e de grande número de pessoas gradas desta capital com suas exmas famílias. Informam-nos que sua excelência teve motivo de satisfação pelos trabalhos já feitos, pela boa direção e pela excellencia do terreno escolhido para semelhante fim.

Fazemos votos para que semelhante estabelecimento agrícola seja o mais auspicioso para esta província.

Em junho daquele mesmo ano o presidente da Província reporta-se à inauguração da Colônia, in verbis:

Relatório com que o Exmo. Sr. Dr. Joaquim de Oliveira Machado, Presidente da província do Amazonas, instalou a Sessão Extraordinária da Assembleia Legislativa Provincial no dia 2 de junho de 1889: encontrei já instalada a Colônia “João Alfredo” no local da antiga Maracajú.

Não confiando na prosperidade d’ella por causa da longa distância, agravada com um extenso igarapé, fundei mais três núcleos – o de 13 de maio, – no Paraná do Careiro, – o de Janauacá, – à esquerda do Solimões (sic) e – o de Oliveira Machado – (denominação devida à gentileza da Commissão de alojamento dos fugitivos da secca) à margem do rio Negro.

Estão lançados os primeiros lineamentos, e se o governo imperial e a Assembleia Provincial lhes derem corpo, a agricultura terá conquistado a Província e feito a felicidade de seus habitantes, Joaquim de Oliveira Machado.

No ano seguinte, o governador do Amazonas, Augusto Ximenes de Villeroy, assina o decreto nº 9, de 11 de janeiro de 1890, contendo as seguintes instruções:

Dá instruções provisórias para o Serviço da Inspeção Geral das Colônias.

O Governador do Estado Federal do Amazonas determina que emquanto nãp for promulgado o Regulamento das colônias, o Inspetor Geral observará as seguintes instruções:

1º – Encarregar-se de todo o trabalho de que estava incumbida a extinta commissão de socorros.

2º – Localizar nas colônias – 13 de Maio – e “Santa Maria de Janauacá” todos os imigrantes das foram extinctas e que n’ellas não tiverem recebido lotes de terra, ou que tendo recebido, pretendem a remoção paras as primeiras.

3º – Providenciar no sentido de serem os imigrantes socorridos sem que tenham necessidade de abandonar os seus trabalhos.

4º – Organisar os papeis relativos a estas instrucções e a boa marcha do trabalho de que é encarregado.

5º – Propor ao Governo o modo de distribuição de socorros em dinheiro ou em gêneros, conforme for mais conveniente.

6º – Providenciar no sentido de distribuir a cada colono um lote de terra, ferramenta agrícola e sementes necessárias à primeira plantação, scientificando a cada um que os socorros cessarão definitivamente logo que se fizer a primeira colheita.

Palácio do Estado Federal do Amazonas, 11 de janeiro de 1890, 2º da República. AUGUSTO XIMENO DE VILLEROY.

O Regulamento das Colônias da Província e o Regulamento para a Hospedaria dos Imigrantes haviam sido redigidos pela comissão designada em 16 de julho de 1889.

Não obstante a atenção dispensada pelo diretor geral, Manoel Uchôa Rodrigues, aos originários imigrantes cearenses, aos quais vieram se agregar outros oriundos de outras colônias extintas, com o fornecimento de alimentos, roupas, medicamentos, assistência médica, pagamento de auxílio em dinheiro durante os seis primeiros meses a contar de sua entrada na colônia e, evidentemente, a demarcação dos lotes onde cada um deveria se dedicar ao amanho da terra, para prover o sustento de suas famílias e produzir a riqueza na região, certo é que dela restou apenas o melancólico registro histórico. A taxa de mortalidade alcançou 10%, o que considerada altíssima para os padrões brasileiros.

No mapa do mês de agosto de 1889, apresentado pelo médico da colônia, Vasco Theopisto de Oliveira Chagas, ao presidente da Província, Manoel Francisco Machado, constam 134 doentes; 101 curados; 16 permaneceram doentes e 17 faleceram. Os cearenses, escorraçados pela seca em sua terra, se defrontaram, pela primeira vez, quando ainda desamarravam o nó do saco de trapos que trouxeram às costas, com a imensidão das águas do rio Solimões que, em 1890, os surpreendeu devastando a incipiente lavoura, o que obrigou o governo, mais uma vez, a promover a distribuição de auxílios diversos. A colônia não dobrou o limiar do século XX. Os colonos dispersaram-se Cambixe abaixo, do que se pode citar, a título de exemplo, Alberto Carneiro da Rocha, cuja família era natural de Acaraú, Ceará, avô do professor Francisco Antônio da Rocha, em busca de outras terras no Careiro, nos seus paranás, lagos e furos, Curari, Terra Nova ou Autazes.

A Repartição de Obras Públicas, Terras e Colonização do Estado do Amazonas, que tinha como seu secretário Cyrillo Leopoldo da Silva Neves, genitor do futuro governador Leopoldo Amorim da Silva Neves, expediu no ano de 1893, vários títulos provisórios de lotes de terra situados nesses lugares, embora não se tenha certeza se os beneficiários eram nordestinos, pois não é declaração da naturalidade deles. Não esperaram sequer a grande enchente de 1909, que alcançou 29,14m, pela cota do rio Negro. Há carta de data de lote de terra situada na boca do Cambixe, expedida a favor de Romão José Negrão, em 1841, anterior, portanto, à instalação da colônia, e outro requerimento de terra, datado de 4/9/1894, de Antônio Gentil Negrão, com os seguintes limites: ao norte, com igapós; ao sul, com o paraná do Cambixe; a leste, com o terreno de Francisco Gonçalves de Souza; e a oeste, com o capitão Florêncio Manoel Negrão. A coincidência é do sobrenome Negrão. Pois bem, Zé Mitôneo afirma que ao chegar ao Cambixe arrendava terra para plantar de uma senhora viúva de sobrenome Negrão, cujo pagamento era feito após a colheita. Não se sabe ao certo o nome do seu ex-marido, mas afirma-se que a viúva de Romão José Negrão ultrapassou em vida os cem anos. É possível que tenha sido essa a arrendante. “Os Farias vieram com a primeira leva. Tio do Zezinho Leôncio, o irmão dele já era casado. A mulher do velho Farias era irmã do meu avô”, disse Rochinha. O professor Antônio da Rocha faleceu em 17/8/2014. Marly Farias, que nasceu no Cambixe, onde permaneceu até o início da década de 1970, nos ofertou esses informes sobre a antiga família Farias. Ela é filha de Almir Farias, falecido em novembro de 2014, aos 86 anos de idade. Ele foi agricultor e pescador. Afirmou que o ancestral, José Farias, a que se referiu Rochinha, era natural de Sobra, Ceará, de onde veio para o Amazonas com outros imigrantes no mesmo vapor. Tinha um filho chamado José Farias Filho, mas faleceu jovem. Seu avô, Raimundo Nonato de Farias, nasceu no Cambixe, era primo de José Leôncio, foi juiz de casamento no Careiro e faleceu em 1978, com 87 anos. Ele era filho do velho José Farias, sendo este, portanto, seu bisavô. Marly tinha um tio que se chamou José Farias Sobrinho. Os jovens Renato Marinho Bezerra e Terezinha Guerreiro Brandão casaram-se perante o juiz Raimundo Nonato de Farias em 1965.

*Jurista e escritor amazonense. Desembargador do TRT, 11ª Região, aposentado; professor aposentado da Faculdade de Direito da UFAM; e membro da Academia Amazonense de Letras Jurídicas. Na década de 1980 juiz trabalhista da antiga JCJ de Itacoatiara. Texto alusivo ao ítem 1, da Parte II do livro “Careiro da Várzea (História, Memórias e Atualidades)”, do autor, recentemente lançado.

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Uma resposta

  1. Gostei muito das informações, gostaria de saber se temos arquivos com registros de entrada no amazonas dos nordestinos vindos em 1918.

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