Manaus, 28 de março de 2024

Transformações

Compartilhe nas redes:

Nestes dois anos a cidade de Manaus experimentou mudança, algumas perceptíveis e outras que surtirão efeito no médio prazo.

Nestes dois últimos domingos do ano, vou propor aos meus sete fiéis leitores urna meditação sobre nossa querida cidade. A capital amazonense não é uma cidade simples. Os desafios são inúmeros e o processo histórico da cidade e fez – com raras exceções -, sem planejamento, sem espírito republicano. Nos últimos anos Manaus experimentou um crescimento populacional como nenhuma capital brasileira, comparável apenas ao fenômeno de migração interna que explodiu a população paulista nos anos 50. A tragédia é que as duas cidades não desenvolveram políticas que respondessem às demandas dos novos habitantes. Ao contrário permitiu-se até mesmo o crescimento de preconceitos que isolaram ainda mais os imigrantes. O ensino foi degradado e nivelado por baixo, permitiu-se a invasão desordenada das terras urbanas e as massas miseráveis serviram apenas como pasto eleitoreiro. O resultado foi a criação de uma cidade agonizante e sem identidade que é Manaus, em permanente autodestruição.

A cidade de Manaus já foi uma cidade culturalmente sólida, embora marcada pela decadência econômica e pelo abandono político.

Sua população carregava uma rica mescla de tradições culturais indígenas, europeiase brasileiras, alicerçada por uma elitista, mas sólida rede educacional. Era uma cidade que usufruía de uma cultura orgânica, coerente, perfeitamente inteligível para a esmagadora maioria da população. Em 1968 o regime militar após cortar ao meio a região amazônica, dividindo-a em Amazônia Oriental e Ocidental, impõe ao Amazonas a Zona Franca de Manaus, área de renúncia fiscal inspirada em soluções coloniais largamente utilizadas na África no século XIX. Do ponto de vista cultural foi um desastre. Entre 1968 e 1970 a cidade Manaus passa de cerca de 350 mil habitantes para 600mil, para atingir a marca dos dois milhões em 2009. Nenhuma cidade suportaria tamanha explosão demográfica sem sofrer terríveis consequências, Especialmente por se tratar de uma explosão demográfica provocada não pelo aumento exponencial da taxa de natalidade dos nativos, mas pela intensiva migração. O Distrito Industrial, planejado para absorver 50.000 operários com baixos salários, tornou-se um polo de atração para os deserdados dos bolsões de miséria mais próximos.

Esta massa de imigrantes provinha de áreas onde não contavam com educação, sistema de saúde, trabalho ou segurança. Este tipo de massa oriunda do campo carrega um dilaceramento cultural profundo, e por isso, em sua nova terra de eleição, não consegue estabelecer vínculos ou compreender a cultura que os recebe, sem que os poderes públicos e a sociedade proporcionem meios de recepção e integração. Infelizmente isto não aconteceu. Levas e mais levas de imigrantes sem qualificação, analfabetos, sem documentos, despidos de identidade, foram espalhados em invasões que se transformaram em favelas. No final do século XX aportavam em Manaus aproximadamente 140 famílias por dia, o que logo se transformou em maioria, soterrando os nativos e colonizando culturalmente a capital amazonense. Nesta realidade sombria, fruto de desídia dos poderes públicos e inércia da sociedade, a percepção da cultura se degradou. O sistema educacional foi incapaz de evitar o esquecimento do passado, porque não conseguiu passar aos que aqui chegaram o que era ser amazonense, os valores amazonenses. Aliás, ninguém, nenhuma instituição ou segmento social percebeu o que se passava e logrou impedira catástrofe. O impacto dos projetos megalomaníacos da ditadura deixou toda a nossa sociedade inerme.

Aparentemente mais rica, a cidade perdeu a elegância.

Compartilhe nas redes:

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

COLUNISTAS

COLABORADORES

Abrahim Baze

Alírio Marques