Manaus, 28 de março de 2024

Redenção sem sangue

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Nos anos de 1964/1965, convivi no Movimento de Cultura Popular de Miguel Arraes, com um paraibano que, por motivo de segurança, só era conhecido pela alcunha de Lupércio. Conversei muito sobre sua opção pela luta armada para derrubar a ditadura e ele sempre repetia: “Ozorio, desde Cristo não existe redenção sem sangue”. Por conta de meus posicionamentos contra a ditadura tive que sair de Recife e seguir para Rio Claro (SP) para continuar o curso de Ciências Naturais e onde fui eleito Presidente do Centro Acadêmico. Foi lá que fui salvo da prisão por um delegado que me disse ter desobedecido a ordem do Dops, por consideração ao Almino Afonso, amazonense como eu, que tinha sido seu colega na Faculdade de Direito de São Francisco. E foi lá que, algum tempo depois, com muita tristeza, soube que o Lupércio tinha encontrado sua redenção, fuzilado e ensanguentado. Louvo sua memória e execro outros guerrilheiros daquela época que hoje estão envolvidos com o poder corrupto e o mensalão.

 

DE VOLTA P’RO ACONCHEGO.

Na pequena e burguesa Rio Claro, fui alvo de uma homenagem imaterial que guardo como um brilhante troféu: Em um domingo, na missa das 8, o bispo D. Mauro Morelli disse no seu sermão: “O Ozorio, esse estudante que estão chamando de comunista, é muito mais cristão do que muitos dos que estão aqui me ouvindo”. Tem muita história nesse meio tempo, mas depois de alguns anos, com estágio na USP voltei para Manaus e para o INPA, com o objetivo de buscar nos recursos naturais, um caminho para o desenvolvimento, lembrando que, naquele tempo esse tema não era moda e muito menos sua adjetivação de sustentável. E foi estudando a biodiversidade que descrevi 2 gêneros e 22 novas espécies para a ciência, uma contribuição talvez modesta, mas muito maior do que aquela arvorada por “defensores da natureza”.

 

UM PARENTESES.

Por dever ético e moral abro um parênteses para dizer que tudo que consegui na vida profissional devo à três homens: Djalma da Cunha Batista que me mostrou o caminho; Augusto Chaves Batista (Recife) que me ensinou a caminhar e Carlos da Silva Lacaz (SP) que me deu a mão e caminhou comigo.

 

E LA FUI EU.

Volto ao cerne desse texto para dizer que, em 1982, por não ter “cintura” fui exilado para o Rio Grande do Sul por um diretor do Inpa alienígena. Aproveitei o doce e saudoso exílio gaúcho para fazer Mestrado e Doutorado com temas ecológico-ambientais que constituem o único alicerce do sustentável desenvolvimento amazônico. Curiosamente, por minha falta de “cintura” fui nomeado Diretor do Inpa que é a mais importante instituição de pesquisa da região equatorial do Planeta, adotando, como princípio básico, os textos “Política Nacional Integrada para a Amazônia Legal” e “Agenda Amazônia 21: bases para discussão”. Mergulhei na busca de opções para reforçando minha atuação como presidente da Comissão Regional de Pesquisas da Amazônia (Corpam) que definiu os projetos prioritários do PPG-7, do Programa do Trópico Úmido, do Projeto Genamaz (Sudam) e do Programa Brasileiro de Ecologia Molecular para o Uso Sustentável da Biodiversidade da Amazônia, que foi a semente do Centro de Biotecnologia do Amazonas. E aí, junto com pessoas de extrema dignidade, fui instituidor da Bioamazônia, uma Organização Social (OS) criada para gerir o CBA e ser responsável por um convênio com a Novartis. A covardia de uma parlamentar do Amazonas (não amazonense) se uniu à insensatez de Fernando Henrique Cardoso para inviabilizar o caminho da redenção sem sangue, usando uma execrável MP (2052/2000), que inviabilizou não apenas o convênio, mas a pesquisa biológica, o CBA, a Bioamazônia, a sustentabilidade do desenvolvimento, além de jogar no lixo a honra de pessoas decentes com o rótulo de biopiratas. Essa semana os jornais noticiaram e comemoraram a instalação de uma fábrica de medicamentos em Manaus, com seus dirigentes acenando para pesquisas com plantas amazônicas. O que aconteceu? A MP foi cancelada? Por que os amazônidas e a Novartis (que tem fábricas no Brasil) não podiam, mas esse grupo pode? O capital tem pátria? A parlamentar e FHC sabem mesmo o que é bio e logopirataria? Por que retardaram 14 anos para adotar essa vida da redenção sem sangue?

Termino esse texto com um informe, uma pergunta e um pressentimento. Informe: meus sigilos bancário e fiscal estão permanentemente abertos; Pergunta: alguém envolvido nessa questão que já tem 15 anos vai seguir meu exemplo? Pressentimento: Alguém está providenciando meu breve encontro com o Lupércio que, cada dia parece ter mais razão.

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