Manaus, 29 de março de 2024

O jardim da minha mãe

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Hoje voltei ao jardim,

ao que restou do jardim

que fora teu santuário.

Olha: foram dolorosas

as recordações das rosas,

que as tinha sempre formosas

em tão belo relicário.

 

Mãe: senti no coração

tanta dor, tal comoção

e tão intenso desgosto

que, cheio de pasmo e espanto,

refugiei-me num canto

pensando esconder o pranto

que escorria do meu rosto.

 

Nem um só cravo ou begônia,

um simples cróton – vergonha!

– ou angélica, ou bem-me-quer;

nem a suave verbena,

mesmo uma rosa pequena,

um lírio ou uma açucena,

Nem uma dália sequer.

 

E os crisântemos doirados,

os bogaris perfumados,

girassol e margarida,

as papoilas, laranjinha,

os jasmins que tantos tinha,

nove-horas, a flor rainha…

morreram por ti, querida.

 

A bela-da-noite, a zina,

cana-da-índia, a cravina,

igualmente – que maldade!

– Sabe Lídia; eu tenho medo,

vou revelar-te um segredo:

cuidar Dele? – sou um aedo,

só sei cuidar de saudade…

 

Refazer o teu jardim?

não posso, Mãe, – ai de mim –

como iria, enfim, fazê-lo?

Sem o teu olhar maternal,

sem tuas mãos, sem igual,

como fazer, afinal?

Não posso – falta o teu zelo.

 

Mãe, sabe o que vou fazer,

já que não posso esquecer

teu sonho que vive em mim?

Em volta do teu solar

vou replantar o pomar

onde sempre ias orar

após saudar teu jardim.

 

E quanto o tempo chegar

do cacau, caju, da ingá,

da graviola e mamão…

em vez de flores, querida,

terás a mesa sortida

com tantas frutas de vida,

ao centro teu coração!

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Uma resposta

  1. Almir Diniz, dotado de uma cadencia métrica de fazer inveja ao músico mais experiente, constrói um dos seus poemas mais belos. Que só a experiencia de um poeta decano seria capaz. Com versatilidade e leveza remota um pouco da saudade e da beleza molda o poeta.

    “…sou um aedo,
    só sei cuidar de saudade…”
    Almir Diniz

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