Manaus, 28 de março de 2024

Música Brasileira da Amazônia I

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Pindorama era uma extensa faixa litorânea, de fronteira verde e humana em que existia uma unidade na diversidade rítmica, de danças e cores plumárias, reforçadas pela formação de um povo, segundo o antropólogo Darcy Ribeiro, nascido do DNA indígena, do negro e do branco invasor, desde os primórdios da pátria, associada a grandes levas migratórias que por aqui aportaram. À primeira vista, houve um estranhamento devido as diferenças culturais do encontro de civilização e povos, mas nada que possa resistir a riqueza do jeitinho brasileiro que oferece um sorriso, um abraço afetuoso da chegada, na convivência anfitriã e pacífica do acolhimento e da bem-aventurança estrangeira em solo tupiniquim.

É claro que nossa consciência sobre o passado ainda lateja nas têmporas do presente ao relembrarmos dois fatos obscuros da História: Ainda é recente os três séculos de  escravidão em que roubaram os filhos da mãe África, promovendo essa diáspora e a guerra que promovemos aos hermanos da nuestra América, a pátria grande com a qual sonhou, desenhou o mapa do caminho, lutou e morreu Simon Bolívar, inaugurando a primeira experiência de um bloco no mercado mundial, porta-voz dos povos latino americanos, estimulando a resistência e a defesa contra os saques das riquezas, o comércio intertribal, o intercâmbio cultural dos países-membros e melhores condições de exportação dos produtos para a Europa e os EUA.

Seguindo as trilhas da História e contextualizando, o Brasil Colonial (1530-1818) que era uma unidade administrativa, estava dividido em dois estados: o Estado da Amazônia, com sede em São Luiz (1621-1652), e, jurisdição do Ceará ao Amazonas, em que a Capitania do Rio Negro só existiu para mostrar a presença do estado português na região, mas o sistema de capitanias hereditárias fracassou, facilitando que expedições estrangeiras explorassem as drogas do sertão, o pau-rainha e a apresagem indígena para os descimentos; e, o Estado do Brasil com sede em Salvador, tinha seus limites que íam até São Vicente. Mas será que a Amazônia sempre foi periferia? Segundo a jornalista Eliane Brum, não! Ela foi o centro do mundo e, recentemente, pelo colapso climático firma posição como uma das capitais planetárias.

E sua importância aumenta: a descoberta dos ‘rios voadores’ sem o devido pagamento dos serviços ambientais; a elaboração de fórmulas indígenas milenares transformadas em extratos que fazem parte do bulário da farmacopeia internacional; os óleos essenciais extraídos da flora sem serem estudados pelo CBA – Centro de Biotecnologia da Amazônia e as seivas que fazem a alegria, a beleza e a riqueza da indústria de toucador. No entanto o canto da mata chora a morte das aves encandeadas pela fumaça das queimadas que afetam a navegação espacial ao não distinguir a imagem natural da superficial; os rituais indígenas, danças étnicas mágicas e os mistérios da maior bacia hidrográfica imitando a função dos rins, purifica esse planeta azul no qual convivemos com a poluição, os garimpos ilegais, a grilagem contínua, o agronegócio criminoso e o contrabando oficial das essências florestais.

A região está no marco regulatório da legislação brasileira desde 1953, com atualizações em 2009; passando pelo Código Florestal de 2012, 77 e CF de 88. Em 2020 o IBGE publicou o novo Mapa da Amazônia Legal que regula limites municipais, estaduais e fronteiriços, integrando Amazonas, Acre, Rondônia e Roraima; Pará, Maranhão, Amapá, Tocantins e Mato Grosso em que o Nordeste, cedeu partes de um estado e o Centro-Oeste entrou com duas para integrar o bioma. Nela convivem diversas UCs – Unidades de Conservação e TIs – Terras Indígenas, perfazendo um total de 5.015.068.18 quilômetros quadrados, compreendendo 772 municípios, perfazendo 58,9%, equivalendo a afirmar que o Brasil é que pertence a Amazônia e não o contrário. Reduzir desigualdades sociais, regionais e reorientar a geopolítica são os objetivos.

O ser humano sempre precisou de proteína animal para o organismo, domesticando o gado há milhares de anos para auxiliá-lo nos trabalhos que exigissem força tanto no campo quanto na cidade, mas também para o melhoramento genético na criação e seleção de plantéis de qualidade para suprir a alimentação humana. Na Índia é considerado sagrado pela população hindu deslocando-se em liberdade pelas vias públicas, a procura de pasto farto, sem ser incomodado pela população. Todavia o gado vacum veio para o Brasil trazido pelos europeus para Pernambuco, Maranhão e disseminado para todas as regiões do país, fato que destaca o Brasil como maior produtor e exportador mundial com alta tecnologia e valor agregado em alguns empreendimentos. Mas sem essa do agro é pop!!! Por que a fome ainda bate na mesa do brasileiro???

Na Ásia também ele é bastante lembrado tanto que a astrologia chinesa incluiu no Calendário Lunar o Boi de Metal que, no folclore dança com o Dragão, como na apresentação na Festa da Liberdade (SP), bairro tipicamente japonês e coreano e que, atualmente, mantem o evento na 3ª maior colônia chinesa no mundo, realizando a celebração do ano 4.719. O Ano Novo começou em 21 de fevereiro de 2021… É momento em que a maioria sai às ruas para festejar. Todavia a empresa da ‘pata do boi’ como grande negócio, nunca deveria ter prosperado em nossa região e merecido fartos subsídios governamentais para sua implantação, pois ela contribui para o desmatamento e queimadas realizadas pelo negócio criminoso do agro. Os cientistas provaram a tese da sustentabilidade que na mesma área é possível produzir mais e melhor, sem necessitar desflorestar o que ainda resta.

Um fato desastroso ocorreu na década 70 em que os ‘fazendeiros’ do Baixo Amazonas, na época da escassez de pastejo em terra firme, em função do aumento de suas boiadas, abriam as porteiras dos currais para que os bubalinos pudessem, ruminar aguapés e capim aquático, assoreando as várzeas, subindo a margem direita do rio Amazonas até Serpa. Consequência cruel é que colônias de pescadores, agentes sanitários e engenheiros de pesca concluíram que o peixe-boi desapareceu em função da rara vegetação suprimida pelo gado preto em sua passagem pelos locais, tendo em vista a área ter sido antropizada. Antes era constante, nesse período, pescadores da Cidade da Canção encontrar filhotes do maior mamífero regional perdidos de sua mãe e mantidos em cativeiro à beira-mar a espera de socorro das autoridades ambientais do município.

Prevendo a situação da espécie Pedrinho Ribeiro, compositor amazonense, gravou no LP Nossa Música, um lamento descrevendo a dramática situação de ameaça ao maior mamífero do bioma amazônico quando, relembrando Igarapé dos Currais, em seu violão plangente, cantou:

Na sombra calada
No Igarapé dos Currais
Vem respirar peixe-boi
Vem me contar como foi
Por que mataram meu boi
Mãe-Catirina não foi…

Os mega projetos dos governos sempre foram de impactos negativos… Na década de 80 ocorreu a inundação do Rio Uatumã para dar vazão a Usina Hidrelétrica de Balbina que desaldeou centenas de indígenas Waimiri-Atroari e seus parentes, remanescentes quilombolas, ribeirinhos e residentes das margens pela ação da elevada acidez da água, levando prejuízos para inúmeros moradores dos municípios que fazem parte do complexo lacustre, exemplo do maior desastre ambiental em grande escala denunciado pelos cientistas do INPA – Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia e repercutido pela imprensa mundial e pelos ambientalistas preocupados com a questão.

A Música Brasileira da Amazônia pretende ser esse canto que, levando a magia e encantos, trazem uma contribuição para o entendimento da região ao defender a indústria sem chaminés, incluindo o turismo sustentável, baseado na exploração da riqueza do folklore como afirmação popular no âmbito da cultura das inúmeras Amazônias que habitam em nós, convivendo com a diversidade da lingua e de fala de um povo. Desse modo a linguagem é ‘socializada pelo espaço de usufruto de indígenas,  passando pelo território de uso dos quilombolas e socializada pelos ribeirinhos da Amazônia’ estaria associada ao homem da floresta que ressignifica sua práxis, elaborando e construindo a partir do imaginário um novo mundo, sem suprimir o verde da nossa bandeira.

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