Manaus, 29 de março de 2024

Maya: o livro do Óscar Ramos

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Embora tenha lido com extrema atenção e frequentemente buscado informações adicionais na internet, confesso minhas dificuldades para ler o livro do Óscar Ramos cujo título – “Maya” – traz o subtítulo -“um japiim na minha janela”- e que foi editado, em 2012 pela Secretaria de Cultura do Estado do Amazonas.

Meu hábito contumaz de leitura me leva a viajar por obras com conteúdos diversos embora minha preferência se volte para temas ligados à ecologia e à questão ambiental especialmente as que abordam o binômio homem-natureza. Os livros (meus) que considero mais densos têm trechos marcados com canetas “marca texto”, e páginas assinaladas com “page makers” (post it). O livro do Óscar está intensamente marcado das duas formas e os page makers com tiras vermelhas para fora parecem línguas desdenhando da minha falta de cultura artística e geral.

Itacoatiara das priscas eras

O livro me fez descobrir que a pequena Itacoatiara onde eu e ele vivemos nossa infância, abrigava dois universos imensos e distintos: o dele e o meu. Vejo que os locais e pessoas que ele relata emoldurando e formatando o cenário de seus primeiros anos, tocaram apenas tangencialmente o meu mundo infantil. O curioso disso tudo é que embora tenhamos idades muito próximas, só fui conviver mais de perto com o Óscar no Colégio Estadual na turma do terceiro científico e mesmo naquele diminuto espaço de uma sala de aula, nossos universos eram distintos. Ele era o aluno que se destacava pela personalidade e pelo raciocínio lógico o que o tornava um “expert” na solução dos problemas de física e matemática repassados pelo Prof. Otavio Hamilton Botelho Mourão, o Mourão preto, uma alcunha diferencial de outro professor com o mesmo sobrenome (Prof. Fueth Paulo) que era o Mourão branco.

Arte e Ciência

O livro do Óscar me levou a estabelecer um paralelo (teoricamente superficial) entre arte e ciência, mais especificamente entre sua aptidão para resolver problemas das ciências exatas e sua arte reticular que ele mesmo coloca dentro das possiblidades de medir matematicamente. Construí outro paralelo na esfera da cinematografia vendo que o cinema entrou na vida do Óscar pela via da arte e na minha pelos caminhos dos filmes de cowboy, os primeiros a focalizar os conflitos do binômio homem-natureza, muitos dos quais podem ser quantificados. E esses dois exemplos reforçaram minha convicção de que ciência e arte tendem a um número, como um ideal.

Conexões

Tenho uma diminuta coleção de filmes de “bang bang” (em vídeo) e frequentemente os revejo, para reacender o “fiat lux” do debate ambiental e que está indelevelmente incorporado à minha vida pessoal e profissional. Esse gênero (ou será espécie) de filme mostra como é atual e emblemática a luta dos pequenos proprietários rurais do oeste americano contra os poderosos fazendeiros que se apossavam das terras e barravam os córregos deixando os moradores de jusante sem possibilidade de acesso a esse recurso natural essencial para a vida. A diferença teórica entre o antigo e o moderno meio rural e o meio urbano-industrial-capitalista é desprezível. Talvez o olhar de um cineasta pudesse mostrar melhor, através da arte do cinema (ou será do filme?) as semelhanças e diferenças entre os conflitos ambientais do passado e dos tempos atuais.

No Óscar, desenho, pintura, escultura, cinema, filmes, poesia, prosa e vida pessoal se misturam como arte fortemente temperada por aquela delicadeza que lhe é própria e que ele considera incomoda, mas que para mim, parece ser a fonte e a essência e de sua obra. Fortemente influenciado por seus sentimentos e experiências de infância, juventude e idade madura, adquiridos e vividos no ambiente familiar, no cenário itacoatiarense, em Manaus, e em longínquos torrões nacionais e internacionais, Óscar construiu sua arte universal e atemporal. No livro alguém diz que o Óscar faz hoje uma obra póstuma. Para mim essa é uma afirmação essencial para a ciência e para a arte, pois assim como é preciso fazer ciência pela ciência, é preciso fazer arte pela arte, independente da aceitação espaço-temporal.

Fui compulsivamente levado a escrever este artigo sobre o livro deste artista, não apenas por causa do transbordamento de arte cultura e ciência que estão inseridas nas suas 120 páginas, mas por ver em sua obra aquela nobreza de caráter alicerçada em princípios morais e éticos que tipificava e tipifica a maioria das pessoas que, em priscas eras, moraram na Velha Serpa e cujo comportamento me levaram a denominar aquele pedaço do Amazonas como Principado de Itacoatiara.

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Uma resposta

  1. É inteiramente emocionante a maneira de como Osório Fonseca articula sobre suas leituras, especialmente, as que se referem à sua terra natal. Eu, que particularmente terminei de alcançar o trigêsimo terceiro ano de vida (todos em Itacoatiara), encontro refrigério no oásis das letras dos escassos intelectuais que chegaram ao meu tempo. Hoje, pouco se escreve, digo melhor, pouco se escreve com qualidade e arte! Estou ensaiando para estrear na literatura, principalmente porque a estiagem de escritores em minha terra me cansa. Felizmente, posso acessar este blog e deparar-me com depoimentos como esse sobre o qual acabo de comentar. Que continue florescendo as boas letras aqui, e que os atuais filhos da antiga Serpa se manifestem com a mesma maestria de Osório Fonseca, Óscar Ramos e Francisco Gomes.

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