Manaus, 29 de março de 2024

Enfim, A recessão acabou! Mas será?

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*Bianca Alvarenga

A economia volta a crescer, depois de dois anos consecutivos de queda. No entanto, a retomada ainda depende da superação da crise política e da redução das incertezas.

Era para ser uma semana destinada ao festejo de bons números na economia. Afinal, o país voltou a crescer, depois de dois anos da pior recessão da história, e o desemprego parou de aumentar – na verdade, o índice registrou uma ligeira queda no último mês. Ao mesmo tempo, o Banco Central reduziu novamente a taxa de juros, dando chance para condições mais favoráveis ao crédito e aos investimentos nos próximos meses. As empresas e os consumidores começavam a se sentir mais otimistas, e a economia, lentamente, retomava aos trilhos. Tudo ótimo, não fosse um grande (enorme, gigante) porém. A delação estrepitosa dos irmãos Wesley e Joesley Batista desencadeou uma nova onda da crise política, desta vez com Michel Temer no centro das atenções. O futuro do governo de transição está em xeque, e tal indefinição já deixou sequelas nas perspectivas econômicas de curto prazo. Com a pinguela de Temer balançando, ficou ameaçado o prosseguimento da agenda de reformas e, dessa maneira, os investidores e analistas passaram a refazer seus prognósticos para o país.

Antes da nova chacoalhada, a economia havia dado sinais de recuperação da vitalidade. Segundo dados divulgados pelo IBGE na semana passada, o PIB avançou 1% nos três primeiros meses de 2017 em relação aos três últimos meses de 2016. Foi a primeira taxa positiva desde o fim de 2014 e deveria representar o término do período de contração econômica. Devería, porque, de acordo com boa parte dos consultores, existe um grande risco de ocorrer outro tombo no segundo trimestre, o que lançaria a retomada, de fato, para a segunda metade do ano – isso se não aparecerem novidades pelo caminho. Parte do bom resultado foi puxada pela agricultura, que cresceu 15,2% em relação ao primeiro trimestre do ano passado. Trata-se do melhor resultado em mais de duas décadas. O desempenho espetacular do campo deve-se à safra recorde de grãos, principalmente nas lavouras de soja e milho. A produção industrial também foi melhor que o esperado, crescendo 0,9%. Embora o setor de extração de óleo e gás tenha contribuído de forma significativa para o desempenho da indústria, setores como o das montadoras de veículos também tiveram uma melhora, motivada pelas exportações.

Para os economistas, entretanto, o quadro do primeiro trimestre é de uma melhora ancorada nos resultados do setor externo, o que não se repetirá da mesma maneira nos próximos meses. Todos os indicadores de demanda doméstica continuam fracos, e não há recuperação econômica que se sustente sem um avanço no mercado interno. O consumo das famílias está no vermelho há nove trimestres, e as despesas per capita já encolheram 12% desde o início da recessão. Os investimentos em máquinas e equipamentos, dado que baliza as expectativas de produção futura, reduziram o ritmo de queda, mas não indicam um quadro alentador. “De forma geral, os investimentos acumulam uma queda de 29% em quatro anos e estão no· nível mais baixo desde 2009”, observou o economista Alberto Ramos, diretor de pesquisas para a América Latina do banco americano Goldman Sachs. São sinais de que tanto as companhias como as famílias continuam encontrando dificuldades para superar os dias de aperto.

Daí a importância das reformas. Com o ajuste nas contas públicas, seria possível acelerar a diminuição dos juros, com efeitos benéficos na disponibilidade do crédito e consequente redução do custo para os investimentos produtivos do setor privado. O enrosco de Temer, contudo, turvou o cenário. Os economistas contavam com uma queda de 1,25 ponto porcentual na taxa básica de juros, mas o BC adotou uma atitude de cautela e decidiu, na semana passada, cortar somente 1 ponto porcentual na taxa.

Em comunícado, a autoridade monetária disse: “O Copom (Comitê de Política Monetária) entende como fator de risco principal o aumento de incerteza sobre a velocidade do processo de reformas e ajustes na economia. Isso se dá tanto pela maior probabilidade de cenários que dificultem esse processo quanto pela dificuldade de avaliação dos efeitos desses cenários sobre os determinantes da inflação”. A taxa básica, a Selic, foi reduzida para lO,25%, a mais baixa desde 2013. O BC, entretanto, deu sinais de que deverá diminuir o tamanho do corte em sua próxima reunião.

Para dissipar as nuvens do pessimismo, o governo Temer se empenha em vender normalidade. Mensagens publicadas na semana passada em redes sociais do Planalto e no perfil oficial de Temer tinham tom comemorativo: “Acabou a recessão! Isso é resultado das medidas que estamos tomando. O Brasil voltou a crescer. E com as reformas vai crescer mais ainda”. O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, seguiu a deixa e comentou: “Hoje é um dia histórico. Depois de dois anos, o Brasil saiu da pior recessão do século”. Embora rumores sobre planos alternativos de reformas tenham ganhado o noticiário, o discurso oficial é de manter o esforço para aprovar o que está em pauta. O governo costurou um acordo e tentará votar o parecer da reforma trabalhista na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado nesta semana. Já a reforma da Previdência está parada na Câmara, e o governo manobra para tentar levá-la a votação antes do recesso parlamentar de julho. A conquista dos 308 votos para aprovar o projeto está difícil, com a fragilidade da base aliada. Aproveitando-se do momento de caos político, categorias de servidores movimentam-se para mudar o projeto e garantir seus privilégios nas aposentadorias. Em um aceno ao Congresso, o governo dobrou a Receita Federal e vai oferecer um programa de refinanciamento de dívidas tributárias (Refis) em termos mais camaradas, com a possibilidade de descontos de até 90% nos juros devidos e 50% nas multas.

O empenho do Planalto é válido, porém a confiança em Temer ficou abalada. As previsões econômicas para o crescimento em 2017 giravam em torno de 1%, mas, nas últimas semanas, recuaram para perto de zero. “É inevitável ver um crescimento do PIB estagnado, mais próximo de zero, abaixo do que esperávamos até então”, diz o economista Sérgio Vale, da consultoria MB Associados. “Para conseguirmos ao menos ficar no zero,  precisaremos de um crescimento razoável no segundo semestre, o que pode estar em risco se a solução política não vier rapidamente.” É cedo, portanto, para afirmar com certeza que a maior recessão da história brasileira tenha sido definitivamente superada. Os brasileiros continuam à mercê das turbulências de Brasília.

*Jornalista. Artigo na Revista Veja, edição nº 2533, de 07/06/2017.

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