(1993)
Em nome da Vida!
Urge que recomecemos
Imediatamente recomecemos
A resgatar o desejo
Que se esquivou de nós,
Mas que é fogo que retorna
Pelo atrito dos corações
Ainda aquecidos
Da última chama!
Precisamos mesmo
Superar essa angústia!
Aliás, precisamos
Anular todos os receios
E principalmente
O de buscar o afeto
E o de se encantar novamente
Com a ternura!
O amor, entre todas as coisas que nos interessam
É aquilo que mais nos interessa agora!
Precisamos erradicar o Medo
A síndrome do medo
A sacralização do medo
Desse medo em que se assentam
Impérios e religiões,
E até do medo de um dia
Não se sentir medo algum!
Em nome da Vida!
É ousar, indagar,
Desfrutar, arguir,
Permitir, conferir,
Consentir, concorrer
Reinventar, inverter,
Cometer, transgredir
Tudo em nome da Vida!
E tudo para afrontar o Medo,
Para impingir aos Titãs do Medo
As suas próprias loucuras!
Não devemos acreditar
Que o Medo seja essa
Potestade inatingível,
Senhor dos nossos destinos.
Somente o nosso levante,
Como num jogo de espelhos psicolépticos,
Poderá deixar o Medo às voltas com a sua própria hierarquia de demônios geniosos.
O Amor – ou buscar o Amor que seja –
Será o nosso alimento
Durante luta tão árdua e inadiável.
Nossa ousadia será o projeto,
Sinopse que descortinará os caminhos
Para o enfrentamento fatal!
Em nome da Vida!
É chegada a hora
De arrostar o Medo
E vencer os seus caprichos.
Ou o Medo ou Nós!
Nenhuma simbiose,
Nenhuma convivência
Serão admitidas.
Pois o Medo é parasita
Que corrói a alma.
Meia-morte que infelicita o Amor.
E, sem Amor, translúcido e são,
Não sobreviveremos Nós!
E começaremos já,
Reinventando canções de ninar
Ousando emoções descabidas
Indagado corações, além dos nossos,
Invertendo a desordem dominante,
Transgredindo o caos estabelecido,
Permutando-nos proibidos desejos,
Analisando intenções subjacentes,
Cometendo os carinhos libidinosos
Consentido os sorrisos fraternais!
Nutriremos a flor!
Que, de tanto medo,
Ganhou áridas arestas,
E murchou o botão natimorto,
Encardindo o vendo
De desbotadas pétalas cinzentas
E odorosos rastros fúnebres!
Em nome da Vida!
Umedeceremos novamente a flor
Com o suor dos nossos corpos
Úmidos de humores espectrais!
E tantas coisas,
Meritórias coisas
Nós umectaremos
Com o suor de nossos corpos.
Pois os nossos suores
Merecem melhor utilidade
Do que a penosa obrigação
da tarefa contraproducente!
Em nome da Vida!
Assim que a flor medrar
E o medo sucumbir
Daremos crédito
Ao fato tão óbvio:
De que o labor e o viver
Não podem ser cativeiro
Coletivo e despersonalizante,
Mas a conquista pessoal
E intransferível!
Os nossos suores,
Em nome da Vida!
Serão destinados
A produzir a catarse
Para que, purificados e decididos,
Possamos ajudar a dádiva
A alentar a flor
E termos o gosto
De vê-la crescer
Diante da indiferença alheia.
Os nossos humores,
Em nome da Vida!
Serão destinados
a produzir o contra-medo,
o antídoto do medo
e o anti-horário,
para combater o absurdo
dos relógios maçantes
desses que marcam
as idades e os medos.
O anti-horário
Não combaterá o Tempo,
Mas desvelará a hora.
Pois a planta sabe
Que o Tempo não tem horas,
Não precisa de horas,
Não tem parâmetros
Nem fusos, nem parafusos,
Nem paradas para descanso!
E, adotado o Tempo sem horas,
Somente descansaremos Nós,
Se for para recomeçar!
Reabastecidos de entusiasmo,
Estudado o estratagema
Melhorado o esquema,
Reciclado o motivo,
De tal forma que
O nosso descanso
Só tenha valor merecido
Se o ócio for benefício
E não pausa obrigatória.
O ócio esperado
no qual se produzirá.
O interregno para ficarmos a sós,
Sob a melhor lunação,
Em algum lugar,
Onde o Medo não terá como saber
Que há um encontro
Realizando a Vida!