Manaus, 28 de março de 2024

Eles nada aprenderam

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Sigo a minha ladainha. E que meus sete leitores não me abandonem. No domingo passado falei da potencialidade turística de nossas cidades do interior. 

Quando penso nessa possibilidade, vem-me logo à mente a cidade de Barcelos (foto), nossa primeira capital, mas que hoje lamentavelmente é conhecida pelo festival do Peixe Ornamental, emulação do Festival de Parintins. Hoje todo prefeito oportunista acha que imitar o Festival de Parintins é a solução, e tome Festival do Abacaxi, Festival da Massaranduba, Festival da Piaçava, etc. É o exemplo típico da ignorância crassa e da baixa escolaridade das oligarquias locais. Nos anos 70 eu exortava aos nossos políticos que ao’ menos frequentassem o MOBRAL. Hoje a maioria tem diploma universitário, mas são que nem a dinastia dos Bourbons: nada aprenderam, mas não esqueceram nada. A cidade de Barcelos é um exemplo dessa indigência educacional dos prefeitos do interior, que rapidamente aprenderam a rapinagem com os seus colegas das capitais. Barcelos foi a sede do Tratado de Madri, no século XVIII. Para lá o governo do Grão-Pará enviou o arquiteto e urbanista italiano, Giusepe Landi, que planejou e construiu uma cidade digna para receber os cientistas, engenheiros e dignitários espanhóis. Barcelos tornou-se a mais bela cidade do interior do Grão-Pará, nem mesmo a Vila da Barra se comparava. Ali se construíram palácios, edifícios para sediar as reuniões das comissões, praças com coretos, um porto, tudo o que havia de melhor na época. O traçado da cidade seguia o rigor racionalista proposto pelo novo urbanismo, livre do barroco. Quando os trabalhos das comissões diplomáticas e científicas terminaram, e a cidade se esvaziou, a seguir perdendo para Vila da Barra o status de sede da Capitania, Barcelos começou a definhar. O abandono e os rigores da selva tropical varreram os palácios e edifícios, restando deles apenas partes dos alicerces enterrados no barro. No entanto, o esplendor de Barcelos vive, arquivado no acervo iconográfico da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. Da mesma forma que as plantas do Forte de São José da Barra estão guardadas nos arquivos militares do Forte de Copacabana. A magnífica cidade de Barcelos, joia americana do gênio de Landi, faz parte da coleção do cientista baiano Alexandre Rodrigues Ferreira, que a registrou para a posteridade, embora os habitantes da esquecida cidade do rio Negro ignore.

Certa vez, quando Amazonino Mendes era governador, estando eu como diretor da Biblioteca Nacional, dei a sugestão que se reconstruísse a Barcelos do século XVIII, e a transformasse num polo de atração turística internacional, como é Williamsburg, nos Estados Unidos, e tantas outras cidades reconstruídas na Alemanha, como o bairro medieval de Nuremberg, de 1951. É claro que esse tipo de reconstrução não agrada ao Ipham, que prefere restauro e, provavelmente criaria caso na hora de mexer com os velhos alicerces. Mas a ideia daria mais frutos que o melancólico Festival do Peixe Ornamental, pois uma herança histórica como essas poucas cidades da América do Sul pode ostentar, ou se dar o luxo de manter enterrada. Infelizmente, até mesmo o turismo, na forma como hoje é entendido pelas oligarquias nativas, pode ser péssimo para a população. Silves que já foi importante no passado e ficou fora da frente de expansão, encontrou na pesca uma forma de sobrevivência com a construção de um hotel que recebe gente de todo o mundo. Mas a modernidade da indústria turística sucumbiu ao coronelismo extrativista, e os nativos continuam a ser tratados como se estivéssemos no século XIX. É só ver como certos hotéis de selva dos arredores de Manaus, cada um decorado com o que classifico de “pesadelo amazônico”, trata os seus funcionários e aqueles que prestam serviços.

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