Manaus, 29 de março de 2024

A Amazônia e o V Império

Compartilhe nas redes:

Por que os jesuítas teriam lhe  dado a sua total proteção?

O padre Vieira encantara-se com a Amazônia. Dizem que subiu o rio Amazonas até Itacoatiara, onde teria fundado a missão de Aibi, na ilha do Risco, em 1655.

A vastidão deste subcontinente terra fortalecido a sua idéia do V Império, em um livro escrito às margens do Tocantins.

padre

O PADRE VIEIRA

O fato é que considerou a Amazônia uma Babel, pela quantidade de línguas aqui existentes e, como gramático, sistematizou muitas delas.

Passaram-se os anos, mas as Ordens Religiosas não ficaram alheias à vastidão da Amazônia e às idéias de Vieira.

Uma Carta Régia de 19 de março de 1693, enfeudaria os territórios da região, com os índios que neles habitavam, às ordens religiosas estabelecidas, em Portugal, o que significava o poder temporal sobre terras e gentes. Aliás a figura da encomenda e dos encomenderos não faziam parte da estrutura colonial portuguesa, sendo mais própria da espanhola, e, sendo adotada, neste momento, pela primeira vez, no Brasil.

As Ordens passavam a ter enclaves feudais, no território português da Amazônia. A Companhia de Jesus receberia todos os indios e as terras da margem direita do Amazonas e de ambas as margens do rio Negro e do Solimões. Os capuchos de Santo Antonio as terras e os índios do Cabo Norte até o Jari e o Paru. Os capuchos da Piedade, as regiões do Gurupá e da mesopotâmia entre o Urubu e o Trombetas. Desta forma, os franciscanos passavam a ser os possuidores da margem esquerda do Amazonas entre o Amapá e o rio Urubu.

A 29 de novembro de 1694, uma nova Carta Régia atendendo reclamações, reformularia a anterior, cedendo o rio Negro e o Solimões aos carmelitas, e o rio Urubu aos mercedários, que haviam sido esquecidos.

Todas as ordens estabelecidas participariam da divisão de Marajó, onde possuíam fazendas.

Assim estava constituído o V Império Amazônico, sob o controle das Ordens Religiosas, uma das últimas tentativas do reestabelecimento de um Estado Religioso, no Mundo, que duraria pouco mais de sessenta anos, até a expulsão de algumas dessas organizações e a suspensão de suas encomendas, durante o reinado de D.José I.

A mesma coisa aconteceria com as missões guaraníticas do Paraguai.

BIBLIOGRAFIA

Malachi Martin – Os Jesuítas – Acompanhia de Jesus e a Traição à Igreja Católica – Editora Record – RJ – 1989

Orlando Neves – Padre Antonio Vieira – Vidas Lusófonas

 

O QUE SERIÁ O V IMPÉRIO RELIGIOSO 

Essas são as palavras de Vieira sobre ele. “Aproxima-se o V Império que durará 1000 anos. Não haverá um Messias a viver entre os homens. Haverá uma igreja governada pelo vigário de Cristo e coadjuvada pelos príncipes seculares. Haverá um só redil e um só pastor, que englobará judeus, cristãos velhos e novos, gentios e hereges. O Templo de Jerusalém será restaurado e permitidos os sacrifícios da Lei Antiga. A Igreja será vista na figura de uma mulher, a do Apocalipse, vestida de Sol, com a Lua aos pés e, na cabeça, uma coroa de doze estrelas. Todo mundo participará da sua luz. O conhecimento de Deus encherá toda a Terra, que será inundada pela água do batismo. O mundo será perfeito. Desaparecerão a maldade e a iniquidade. Habitará o lobo com o cordeiro e deitar-se-á o leopardo com os cabritos. Os homens viverão vida longa, muitos chegarão aos 1000 anos e assistirão à vinda do anti-Cristo, que será vencido e aniquilado. Então será o fim do Mundo e o reino dos bem aventurados, para sempre, de que o V Império é apenas o limiar. Isto só acontecerá quando a Fé invadir toda a Terra”.

 

O V IMPERIO AMAZÔNICO CRESCE

As idéias de Vieira de um V Império, somente poderiam ser concretizadas, na Amazônia, região de dimensões continentais, a maior extensão de terras do Império Colonial Português. Porém não se tratava de um Império leigo e sim religioso, comandado pelas Ordens e pelos Estados Pontifícios.

Como dirigente dos jesuítas Vieira palmilhara toda a região, rio Amazonas acima, até Itacoatiara.

As negociações entre o rei de Portugal e as Ordens Religiosas criaram a possibilidade desse gigantesco Império Religioso, quando Dom Pedro II, expediu as Cartas Régias de 19 de março de 1693, dividindo as terras e os índios da região entre os jesuítas e os franciscanos, seguida da de 29 de novembro de 1694, em que os carmelitas e mercedários entravam nessa divisão, estabelecendo o domínio religioso sôbre a Amazônia. Vejamos o que aconteceu nesses vastos domínios eclesiásticos através dos anos, até a sua eliminação aqui e no Paraguai.

 

OS JESUITAS 

Inácio Lopez, depois de Loyola, espanhol basco; Pedro Fabro, francês; Francisco Xavier, Alfonso Salmerón, Diego Laynez e Nicolau de Bobadilla, espanhóis, e Simão Rodrigues, portugues, todos estudantes da Universidade de Paris, a 15 de agosto de 1534, encontraram-se na capela dos Mártires, em Montmartre, e fundaram a Companhia de Jesus. Em 1537, foram à Itália buscar a regularização da nova ordem, tendo o papa Paulo III  autorizado as suas ordenações, pelo bispo de Arbe.

Inácio, Fabro e Laynez de novo foram a Roma, em outubro de 1538, para pedir ao papa a aprovação da ordem. A congregação dos cardeais deu parecer positivo à constituição apresentada, e, a 27 de Setembro de 1540, Paulo III confirmou a ordem através da Bula “Regimini militantis Ecclesiae“, que integrou a “Fórmula do Instituto”, onde está contida a legislação básica da Ordem, cujo número de membros foi limitado a 60. Esta quantidade foi alterada pela bula  Injunctum nobis, de 14 de Março de 1543, sendo Inácio escolhido como primeiro superior geral, enviando os seus companheiros e missionários para vários países europeus, com o fim de criar escolas, liceus e seminários.

 

loiola

Inácio de Loiola  e  Paulo III

 

Inácio escreveu as constituições jesuíticas adotadas, em 1554, originando uma  ordem disciplinada, abnegada e obediente aos seus superiores e ao Papa. O seu grande princípio tornou-se o lema dos jesuítas: “Ad maiorem Dei gloriam” (“para maior glória de Deus”).

Corria o ano de 1615, quando, acompanhando a tropa de Alexandre de Moura, chegaram os jesuítas às terras do Maranhão, representados pelos padres Manuel Gomes e Diogo Nunes. A seguir, a partir de São Luis, os padres Benedito Amador, Lopo do Couto e Luis Figueira evangelizaram o rio Monim.

Luis Figueira foi a maior figura da Ordem, nesses primeiros anos da sua existência, na Amazônia. Promoveu a catequização do Xingu, onde fundou a missão de Itacuruçu (Veiros), em 1637, e a de Sousel, em 1639.

A Ordem progredia, o que obrigou a vinda de mais religiosos, para ajudarem nos trabalhos. Em 1643, embarcaram, em Lisboa, quatorze jesuitas com destino à Amazônia, acompanhando o recém-nomeado governador Pedro de Albuquerque. A nau em que viajavam naufragou, nas costas da ilha de Marajó, tendo morrido nesse desastre cerca de onze missionários, entre os quais o padre Luis Figueira, uma grande perda para Companhia de Jesus, talvez comidos pelos índios aruãs.

A partir de 1650, os roupetas tomaram novo alento. Continuaram a evangelização do Xingu, chegaram ao Tapajós e ao Médio Amazonas, e estiveram em grande atividade, no rio Pará.

Em 1652, mais nove jesuítas, sob a direção de Francisco Veloso, vieram reforçar as suas ações, sendo fundado o Colégio de Santo Alexandre, em Belém, a 26 de janeiro de 1653, peça fundamental para a expansão da Ordem. Desta época foram as lutas desencadeadas entre a Companhia e os colonos, esses interessados na escravidão dos índios.

As primeiras instruções reais proibindo o resgate dos indígenas foram as de 1652. Com a revolta da população, tais instruções foram sustadas através da Carta Régia de 17 de outubro de 1653, que fazia algumas concessões aos colonos.

A 24 de novembro aportava ao Pará o padre Antonio Vieira, investido na autoridade de Superior das Missões. Graças à sua interferência foi redigida a Carta de 9 de abril de 1655, que de novo libertava os selvagens e entregava o poder temporal sobre eles à Companhia de Jesus. Durante seis anos houve paz aparente, quebrada, em 1661, pelos próprios colonos ao efetuarem a primeira expulsão dos jesuítas do Estado, que somente retornariam por força da Carta Régia de 12 de setembro de 1663.

A luta pela emancipação dos índios ainda perduraria por muito tempo.

A Lei de 28 de abril de 1688 restabeleceria o cativeiro indígena, mas foi a seguir anulada, pela de 6 de dezembro de 1705.

No curto período de quarenta anos (1616-1655) a Ordem crescera e em todas as expedições então formadas para o reconhecimento do interior, havia a sua presença efetiva.

Fazendo-se acompanhar do sargento-mor João de Souza Soleima, os jesuítas João de Souto Maior e Salvador Melo foram aos Pacajás, enquanto Francisco Veloso e Manuel Pires, em 1657, fundavam uma missão no rio Tarumã, afluente do rio Negro, na região de Manaus.

Entre 1655 e 1660, o padre Manuel Nunes foi ao Tocantins, ao mesmo tempo em que Pedro Biscainho e o padre Manuel Veloso apoderavam-se de 1.200 tupinambás, trazendo-os para a ilha do Sol. Na companhia de Monteiro Pucu, os inacianos Manuel Pires e Manuel de Souza foram missionar os tupinambaranas, os aruaques e os condorizes; Manuel Nunes, os jurunas; Antônio Fonseca, os cariatós e, finalmente, em 1661, o padre Antônio Vieira pacificou os 40.000 aruãs da ilha de Marajó.

Após o seu regresso ao Estado, em 1663, a Companhia reencetou os seus avanços, agora em terras do atual Estado do Amazonas.

Em 1671, o padre Gersony desceu  do Japurá cerca de 800 índios solimões, em 1687, o padre Iodoco Peres missionou os irurizes do Madeira e João Ângelo com José Barreiros evangelizaram o rio Aripuanã.

No Maranhão, a revolta de Beckman, em 1684, redundou na segunda expulsão dos jesuítas do Estado, se bem que restrita a uma parte do mesmo.

Finalmente veio a Carta Régia de 19 de março de 1693, seguida da de 29 de novembro de 1694, estabelecendo o domínio religioso sôbre a Amazônia.

O movimento expansionista dos religiosos continuou principalmente o dos discípulos de Loyola. Em 1721, Manuel Mota foi ao Itacaiunas, o padre João Sampaio evangelizou o Madeira, fundando, em 1728, uma missão nas cachoeiras de Santo Antônio.

Apesar de todo esse trabalho desenvolvido, os jesuítas, implicados na tentativa de morte do rei D. José I, foram expulsos do reino, a 3 de setembro de 1759. A  nau Nossa Senhora de Arrábida, chegada a Belém, a 16 de julho de 1760, trouxe as forças militares necessárias para as prisões. O Colégio de Santo Alexandre foi cercado e dentro de pouco tempo os 150 padres existentes na região foram deportados para Lisboa.

Após 145 anos de trabalhos na Amazônia, a Companhia de Jesus fundara algumas dezenas de missões, origem das cidades existentes nesta região, entre as quais podemos apontar as constantes do quadro que se segue:

 

ANO

MISSÃO

CIDADE

RIO

1637

Itacuruçu

Veiros

Xingu

1639

Sousel

Xingu

1639

Piauori

Pombal

Xingu

1639

Maturá

Porto de Moz

Xingu

1653

Maracanã

Cintra

1653

Mortiguara

Beja

Pará

1653

Araticu

Oeiras

Araticu

1653

Aruacará

Portel

Pacajá

Borari

Alter do Chão

Tapajós

Santo Inácio

Boim

Tapajós

1661

Tapuiuçu

Santarém

Tapajós

Taparajó Tapera

Aveiro

Tapajós

Matapu

Pinhel

Tapajós

1655

Aibi

?

Amazonas

Arapiuns

Vila Franca

Tapajós

Uruitá

Vigia

Pará

Aricuru

Melgaço

Pacajá

Cumaru

Poiais

Negro

Samauma

1668

Santo Elias

Airão

Negro

1696

Abacaxis

Itacoatiara

Abacaxis

1728

Trocano

Borba

Madeira

1723

Santo Antônio

Santo Antônio

Içá

1728

Santo Antônio

Madeira

São Francisco

Humaitá

Madeira

 

Enquanto os jesuítas portugueses faziam tais esforços, os seus colegas espanhóis animados do mesmo zelo e dedicação, em momento nenhum se descuidavam de suas obrigações catequéticas, e foi assim que o padre Samuel Fritz, natural da Boêmia, tornou-se o Apóstolo do Solimões.

Acompanhado do padre Richter, Fritz chegou ao Marañon e, em 1686, promoveu a catequese dos omaguas, aisuares, tarumãs, ibanonas, xabecos e cocamas, tendo fundado inúmeras missões no rio Solimões. Assim apareceram as localidades de Taracuateua (Nossa Senhora de Guadalupe de Fonte Boa), a de São Paulo dos Cambebas (São Paulo de Olivença), a de Santana de Coari (Coari), a de Amaturá ou São Cristóvão (Castro de Avelães) e a de Santa Tereza de Tapé (Ega ou Tefé), todas no decorrer do ano de 1689.

Em 1689, Fritz foi preso, em Belém, como espião, sendo solto dois anos após e a seguir recambiado para o Peru, com uma escolta de 20 homens, sob o comando do capitão Antônio de Miranda Noronha. Em Lima, o vice-rei Melchior Portocarrero Lazo de La Vega, Conde de Manchova, deu-lhe víveres e dinheiro, determinando-lhe a volta para o Solimões, onde, em 1704, foi substituído por João Batista de Sana.

Dando cumprimento à Carta Régia de 20 de março de 1708, que mandava proteger o Solimões, o governador Costa Freire mandou Inácio Correia de Oliveira, em 1709, expulsar os jesuítas espanhóis da região do Solimões, o que conseguiria temporariamente.

O padre Sana recebera ajuda do governador de Quito Dom Luis de Iturbide e retomara às missões recém-ocupadas, prendendo Inácio de Oliveira, um carmelita e cinco soldados portugueses. O sargento-mor José Antunes da Fonseca, com 130 soldados e 300 índios, derrotou-o, em 1710. Em 1749, os jesuítas espanhóis já haviam evacuado a região, pois a última aldeia da Missão dos Maynas era Santo Inácio de Pebas, onde as tropas de resgate de Manuel Coelho, em 1663, e de Francisco Lopes, em 1673/74, prearam muitos índios.

No Madeira, a expedição de Francisco de Melo Palheta, em 1723, bloqueou a penetração dos jesuítas espanhóis das Missões de Santa Cruz de La Serra ou Mojos, que já possuíam a aldeia de Santa Cruz de Cajuava, no Mamoré, logo abandonada. O rio Negro não sentiu essa ação, uma vez que os inacianos espanhóis não chegaram a ultrapassar o Cassiquiari, onde, em 1726, Francisco Xavier de Moraes, ao descobri-lo, encontrou o padre  Manuel Romão.

 

OS CARMELITAS 

No século 12, na Europa, surgiu um movimento de leigos que buscavam viver um cristianismo mais autêntico, indo à peregrinação à Terra Santa. Ali, alguns se estabeleceram no monte Carmelo, o monte Horeb da Bíblia, perto da atual Haifa, local para onde se retirara o profeta Elias, seguindo uma vida eremítica de oração e de silêncio. Dentro desse ideário esses peregrinos estabeleceram a Ordem dos Irmãos da Bem-Aventurada Virgem Maria do Monte Carmelo, ou simplesmente Ordem do Carmo, sendo os seus membros denominados de carmelitas ou carmelitanos. Santo Elias passou a ser o seu santo maior.

Mais tarde, a Regra do Carmo foi sistematizada e proposta por Santo Alberto, Patriarca de Jerusalém, e aprovada pelo Papa Honório III, em 1226. Um pouco antes, entre os anos de 1206 e 1214, o papa Inocêncio IV aprovara o seu modo de vida, incluindo os três votos evangélicos de pobreza, castidade e obediência. No século XIII os seus componentes migraram para o Ocidente, fugindo das invasões sarracenas.

Já no século 16, na Espanha, houve uma renovação liderada por Santa Teresa de Ávila e São João da Cruz, famosos místicos da ordem, dando origem aos carmelitas descalços.

O espírito carmelita foi vivido ainda pelos leigos nas Ordens Terceiras, Confrarias e Fraternidades do Escapulário, Juventude Carmelitana Missionária, Infância Missionária Carmelitana e nas diversas congregações agregadas à Ordem do Carmo.

Ao longo da história, os carmelitas deram à Igreja muitos santos, beatos e mártires, entre os quais, citamos os mais populares: Santa Teresinha do Menino Jesus, padroeira das missões, São João da Cruz, Santa Teresa D’Ávila, Santa Edith Stein, os beatos Tito Brands e Hilário, mártires dos campos nazistas, São Simão Stock, o santo do escapulário, beato lzidoro Bakanja, mártir africano, santa Madalena de Pazzi, além de muitos outros.

As Ordens Terceiras foram associações de leigos católicos, vinculadas às tradicionais ordens religiosas medievais, em particular às dos franciscanos, carmelitas e dominicanos, reunidos em torno da devoção de um santo padroeiro. A dos carmelitas foi uma das mais importantes do Brasil, tendo capelas, hospitais e cemitérios próprios, em total apoio à Ordem a que estavam vinculados.

Os primeiros carmelitas da região amazônica foram frei Cosme da Anunciação e frei André da Natividade. Chegaram com as tropas de Alexandre de Moura, fundando logo um convento na ilha do Medo, no Maranhão. André da Natividade e Antônio de Santa Maria foram os primeiros carmelitas a se estabelecerem em Belém, em 1624, promovendo, em 1626, a fundação de um convento por ordem do vigário provincial frei Francisco da Purificação.

Embora esquecidos pela Carta de 19 de março de 1693, receberam, pela de 29 de novembro de 1694, o rio Negro e o Solimões.

O governador Antônio de Albuquerque Coelho de Carvalho, o Moço, mandou o carmelita frei Manuel da Esperança ocupar as missões jesuíticas do Solimões, em poder dos espanhóis. O padre não conseguiu o seu objetivo, porém, coube-lhe ao menos a glória de ser o primeiro na descrição da utilização da borracha, já então usada pelos índios cambebas. As missões do rio Negro foram ocupadas pelo frei João Evangelista, que governou a missão de Santo Elias, transferida para a foz do Jaú, em 1732, e por frei José de Madalena, o apóstolo do rio Negro.

A missão de Nossa Senhora da Conceição de Mariuá, depois Barcelos, foi fundada por Frei Matias de Boaventura, em 1728.

Abaixo transcrevemos um quadro demonstrativo das missões dos Carmelitas:

NOME INICIAL NOME PORTUGUES
Santo Alberto de Araçari  Carvoeiro
Santo Elias de Jaú Airão
Santo Ângelo de Cumaru Poiais
Nossa Senhora da Conceição de Mariuá Barcelos
Santa Rita de Bararoá Tomar
São José do Dari Lamalonga
Nossa Senhora do Carmo das Dores Boa Vista
Nossa Senhora do Carmo de Caboquena Moreira
Santa Rita de Itarendaua Moura
Nossa Senhora do Rosário de Manaus
Caiçara Alvarães
São Pedro dos Jucanas
Santana de Coari
Santa Tereza de Tapé Ega
São Paulo dos Cambebas São Paulo de Olivença
Amaturá ou Envirateua Castro de Avelães
N. S.de Guadalupe de F. Boa Fonte Boa

OS MERCEDÁRIOS

A Ordem Real e Militar de Nossa Senhora das Mercês da Redenção dos Cativos ou, mais simplesmente, Ordem de Nossa Senhora das Mercês foi uma ordem religiosa fundada por São Pedro Nolasco, em 1223, no reino de Aragão, na Espanha, para libertar os cristãos, que estavam cativos dos mouros. Para isto, ele teve um sonho com a Santíssima Virgem e contando-o ao rei Jaime e ao seu confessor Raimundo Penaforte, este o informou ter tido o mesmo sonho naquela noite. Sem demora, fez voto de pobreza, castidade e obediência, acrescentando o quarto, de sacrificar os bens e a própria liberdade, se necessário fosse, pela redenção dos cativos.  São Raimundo foi quem organizou as constituições da nova ordem, nascera no castelo de Penaforte, na Catalunha, em 1175.  De ascendência nobre, tinha parentesco com os reis de Aragão, e , desde a mais tenra idade revelava grande interesse pela  oração e  pelo estudo.

São santos mercedários María de Cervelló, Pedro Nolasco, Ramón Nonato, Raimundo Penaforte, Pedro Armengol, Pedro Pascoal e Serapio.

Com o regresso de Pedro Teixeira, do Peru, a Ordem chegou ao Estado. Integravam-na àquela época os padres Pedro de la Rua Cirne, Juan de la Merced, Alfonso Almejo e Juan de la Concepcion Cirne, que, em 1640, fundaram o primeiro convento mercedário, em Belém.

Decretada a Restauração, por ser ordem espanhola, os mercedários foram  expulsos, somente conseguindo voltar ao Brasil, em 1646. Sua ação restringiu-se às bacias do Urubu, Uatumã e Anibá.

Em 1660, o padre Raimundo fundou a missão Saracá, que mais tarde passou a se chamar Silves, considerada a mais antiga povoação do Amazonas. Em 1663, fundaram as missões de São Pedro Nolasco e São Raimundo Nonato, no Urubu.

A Bula Ingeniosa Reginarum Illustrium de 1787, expulsou-os do Brasil, mas só, em 1794, é que se retiraram do Pará.

O aviso de 24 de março daquele ano seqüestrou-lhes as fazendas de Val de Cães, Santana, São Pedro e São Lourenço, sítios, retiros e o convento. Todas as suas propriedades estavam avaliadas em 232.598$770.

 

OS CAPUCHINHOS OU FRANCISCANOS]

Na Amazônia esses religiosos subdividiam-se em três grupos, que chegaram à região em época diferentes

Os primeiros foram os capuchos da Província de Santo Antônio, que vieram na expedição de Jerônimo de Albuquerque, para a conquista do Maranhão. Frei Cosme de São Domingos e frei Manuel da Piedade foram os participantes daquela conquista.

A Província de Santo Antonio, de religiosos franciscanos da «mais estreita observância», foi formada em obediência à bula Sacrae religionis sinceritas, de 8 de Agosto de 1568, tendo a sua sede no convento de Santo António dos Capuchos, em Lisboa. Formou-se a partir de um grupo de casas caracterizadas pelo rigor e o recolhimento, o afastamento do profano, razão pela qual os seus religiosos se chamavam «Recoletos». Tendo constituído um ramo franciscano, na Itália, por iniciativa do Ministro Geral frei Francisco dos Anjos, em 1524. Estenderam-se a Portugal, onde formaram uma Custódia, em 1565. Desta província derivou a Província da Conceição da Beira e do Minho, em Portugal.

No Pará, a 22 de julho de 1617, freis Cristóvão de São José, Sebastião do Rosário, Felipe de S. Boaventura e Antônio de Marciana, capuchinhos de Santo Antônio, fundaram o convento do Una, em Belém.

Após os capuchos de Santo Antônio chegaram os capuchos de Nossa Senhora da Piedade ou de São José, totalizando nove religiosos, vindos de Lisboa, que, em novembro de 1693, foram instalados em Gurupá. Por último, em 1706,  chegaram a Belém os capuchos da Conceição da Beira e Minho, que instalaram o convento de São Boaventura.

Na divisão estipulada pela Carta Régia de 19 de março de 1693, os capuchos de Santo Antônio receberam a região do Cabo Norte até o Jarí e o Paru, cabendo aos da Piedade as áreas do Gurupá e a do Trombetas ao Urubu, esta perdida  para os mercedários, no ano seguinte.

Em 1708, os capuchos da Piedade fundaram no igarapé de Taracuera, afluente do Uatumã, uma missão destruída pelos pariquis, que mataram os padres Antonio de Vila Viçosa e Pedro de Évora e lançaram o sino da missão no igarapé.

Abaixo enumeramos as missões de que eram possuidores os capuchinhos:

CAPUCHOS DE SANTO ANTONIO

Urubuquara Prainha
Paru Almerim
Menino Jesus
Arajatuba
Bocas
Acarapi

 

CAPUCHOS DE SANTO ANTONIO

Urubuquara Prainha
Paru Almerim
Menino Jesus
Arajatuba
Bocas
Acarapi

 

CAPUCHOS DA CONCEIÇÃO

Uaramacu Arraiolos
Mangabira
Cajá
Conceição
Iari
Tuari

 

CAPUCHOS DE SÃO JOSÉ OU PIEDADE

Surubiú Alenquer
Jamundá Faro
Matura Porto de Moz
Cauiana Vilarinho do Monte (1639)
Pauxis Óbidos (1697)
Gurupatuba Monte Alegre
Curuá
Meneruá
Arapijó

 

Em 1758, foram afastados do Pará, pelo aviso de 5 de fevereiro, os Capuchos da Piedade e pelo de 12 de abril, os da Conceição. Os primeiros regressaram para Lisboa e os últimos,  para São Luis.

Com o correr dos tempos as ordens religiosas passaram a dedicar-se à vida econômica, na Amazônia, despertando com isso grande cobiça e despeito entre os colonos, dada a prosperidade obtida, graças aos métodos de trabalho adaptados à psicologia indígena.

Tornaram-se os maiores criadores de gado bovino, na ilha do Marajó, onde os currais dos seculares eram todos pequenos em relação aos dos religiosos. O gado fora ali introduzido, em 1644, e a primeira ordem a ocupar-se de sua criação foi a dos Mercedários, estabelecida na ilha de Santana, na foz do Arari.

Em correspondência enviada pelo governador Francisco Xavier de Mendonça Furtado ao seu irmão, o Marquês de Pombal, em 1751, calculava aquele governante em 60 a 100.000 cabeças o gado dos mercedários, que liquidavam 12.000 crias por ano; em 25 a 30.000, o dos jesuítas, e em 8 a 10.000, o dos carmelitas. Na mesma carta externava a seguinte opinião: “Eu não sei certamente a quantidade de gado que estas religiões têm naquela ilha, mas é certo e constante que é infinita e que só este dizimo poderá aumentar em muito as rendas atuais da Fazenda Real”.

As fazendas foram incorporadas à Coroa, pelo aviso de 2 de agosto de 1757, e pela expulsão dos mercedários, em 1787, pedida pelo bispo Dom Caetano Brandão.

Em 1759, as Ordens possuíam os bens abaixo, discriminados:

 

ALDEIAS

FAZENDAS

RENDA ANUAL

Jesuítas

20

22

164.600$000

Carmo

10

13

32.400$000

Mercês

3

17

Piedade

8

2

 

As aldeias e fazendas dos franciscanos, incluindo os de Santo Antonio, rendiam 24.000$000 anuais.

As ordens não se ocupavam apenas da criação, tinham também engenhos, salinas, bem como fazendas agrícolas. Para se ter uma ligeira idéia disso, basta citar que os jesuítas, de 1730 a1750, tiravam anualmente 2.000 arrobas de açúcar do engenho Mocajuba e 5.000 alqueires de sal, em Salinas. Em 1734, suas fazendas do Madeira produziram 2.500 arrobas de cacau, além de cravo e canela. Só um engenho do Maranhão produzia 2.000 canadas de aguardente. De suas 22 fazendas cerca de 7 eram agrícolas e 15, de criação, sendo 9, em Marajó e 6, no Maranhão.

Mendonça Furtado via nos jesuítas o perigo da penetração estrangeira, pois, em 1754, existiam os seguintes missionários de origens diversas, na Amazônia: Henrique Offmayer e Antônio Meisterbourg, no Abacaxis: Martinho Schwartz, em Melgaço e Anselmo Eckart, Antonio José e Roque de Hundertpfundf e Inácio Szentamartoni, em Borba.

Em carta de 10 de fevereiro de 1754, dirigida a Pombal, Mendonça Furtado dizia dos jesuítas: “Esta gente nem faz caso da religião, nem da caridade do próximo, nem do bem comum do Estado, porque primeiro que tudo para eles está qualquer leve conveniência”.

Em outra missiva de 29 de junho do mesmo ano relatava: “Nesta terra há uma nova doutrina evangélica porque se governam estes missionário – Cristo Nosso Senhor ordenou que eles fossem pelo mundo a pregar, mas logo lhes mandou que nem sapatos, nem capuz, nem ao menos um bordão tivessem de seu, e estes que aqui pregam a doutrina evangélica se não estiveram carregados de ouro e com grandes tesouros a sua ordem, não podem fazer progresso algum”. Mendonça Furtado foi um dos principais responsáveis pela expulsão dos jesuítas das terras portuguesas.

Na realidade, por trás da evangelização estava o utópico V Império das Ordens, a tentativa de um estado religioso, dirigido pelos missionários, que procurava proteger os indígenas da escravização, pelos colonos europeus, em uma tentativa de organizá-los em comunidades autosuficientes, mas que acabou por facilitar a sua absorção. No seu afã de catequese, as Ordens destruiram as tradições ancestrais masculinas, o seu núcleo etnico-religioso; substituiram as habitações coletivas, o núcleo do gruipo guerreiro, por casas individuais; quebraram a idéia da nação indígena; estabeleceram linguas gerais; amansaram a índole indígena, em  suma, criaram as condições de absorção cultural, transformando os índios, de povos livres em cabôcos, os tirados do mato, prontos para a absorção final, também o objetivo do estado laico português.

Compartilhe nas redes:

4 respostas

  1. adorei! me ajudou muito na minha pesquisa PARABÉNS VOCÊ FOI BASTANTE CRITIATIVO E OBSERVADOR AO COLOCAR TODA A HISTORIA DAS ORDENS RELIGIOSAS NA AMAZÕNIA

  2. Eu gostaria de saber exatamente qual ano o Frei José de Madalena chega ao Amazonas, pois não fica claro na artigo, apesar de que o texto é sensacional. Essa questão nunca é explicada, não se sabe de onde ele veio, quando chega ao Amazonas e assume Barcelos é sempre muito vago. Um personagem tão importante para a história do Amazonas e que se conhece pouco ao seu respeito. Entretanto, o trabalho apresentado é valiosíssimo, parabéns!

  3. Prezado senhor Antônio Barbosa. Desculpo-me, inicialme, por que somente agora vi o seu comentário. Sugiro a leitura do livro do falecido Arcebispo Metropolitano de Belém (antes foi bispo do Amazonas!), dom Alberto Gaudêncio Ramos, “Cronologia Eclesiástica do Pará”, Belém, 1985, e Arthur Cézar Ferreira Reis, “História do Amazonas”, Manaus, 1989. Poderá encontrar ditas obras na Biblioteca Pública do Amazonas – cujo corpo de servidores, muito competente, seguramente o orientarão. Qualquer coisa, use meu e-mail franciscogomes.hist@hotmail.com. Grande abraço amigo.

    1. Obrigado, já li várias obras, inclusive as Notas Históricas, frei Prat, onde cita a chegada do referido frade em 1730, porém sem muita certeza. As obras do Artur Cézar Reis, boa parte são tiradas de fontes que já estão no meu acervo, porém vou ler com acuracidade, pois elas são muito ricas. Em relação à dos bispo Gaudêncio vou pesquisar agora. Parabéns pelas publicações.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

COLUNISTAS

COLABORADORES

Abrahim Baze

Alírio Marques