Manaus, 29 de março de 2024

Senhora de si

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Nenhum idioma poderá decantar
Tão louvadamente
Tua insólita promessa de iara.

Nenhum dramaturgo te saberá o nome
Poeta algum cantará impunemente
tua face sem pintura.

Na desarmonia espontânea
dos teus hemisférios
Brincas de deusa e de dança

O dorso, o colo
A escalada desafiadora
Teu universo incomensurável.

Há em ti um ponto à espera
Uma espera circundante
Escolherás o horizonte que te cerca.

Transversal e perpendicular
Planície encharcada
Depois a quietude sem culpa.

Perambulas por meridianos
sem te deteres em nenhum.
Melhor construíres outros,
mais condizentes com tua geografia.

Ao alcance da mão?
Há quem se engane!
Teus paralelos estão aquém e além

Tua nudez ou tua rudeza
Uma pertence à tua essência
Outra é mítica inocência

Tuas medidas
Quem poderá aferi-las?
Sem métrica, possuis ritmo próprio.

Entre o pecado e a graça
Entre a vingança e o perdão
Transitas na corda mágica da gratuidade.

Um gesto, e machucarás a quem amas
Outro gesto, e salvarás o mundo
Destino de co-criadora.

Podes salvar
Podes matar
Serás venerada por salvares
E perdoada por matares

A intumescida carne
A lubrificação desperta
A urgência da criação venturosa.

Insuflas os seios
Expandes o ventre
Destino de gerar e renascer.

Tuas entranhas se arrebentam
o fruto a amadurecer
Deformado corpo, realizada alma.

Unir detalhes,
cerzir nuances,
alinhavar medos com desafios:
a manufatura da existência precisa de tuas mãos

A vaidade te fez flor
A necessidade, mãe
A cumplicidade, mulher

Tu és a pássara e a uva seduzidas pelo mesmo mistério da luz.
Não foram tuas curvas que te fizeram feminina,
senão as direções a que levaram.

Transformastes o verso em sedução.
A escrava vestiu-se de imperatriz
e se fez senhora de si
Para dizer a ordem e a desordem
O vasto e o mínimo da existência.

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