Manaus, 28 de março de 2024

Grupo Escolar Coronel Cruz

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A descendente de imigrantes europeus Ana Luiza Fabriz, filha ilustre da progressista cidade de Cascavel, localizada na região oeste do Paraná, a 492 quilômetros de Curitiba, é uma legítima representante da moderna e espirituosa mulher brasileira. Em meados da década de 1990 veio para Itacoatiara em companhia de seus pais, esposo e filhos e desde logo se tornou uma das mais apegadas filhas adotivas desta cidade. Empresária no ramo da educação de crianças, atualmente está cursando faculdade. Participou dos cursos de História de Itacoatiara (I e II) que empreendemos em 2011 e 2012 no Centro Cultural Velha Serpa. É leitora assídua de temas literários, de história da Amazônia e os relacionados à Itacoatiara. Aqui e ali permutamos informações e trocamos ideias. Sempre interessada nas coisas da comunidade, ultimamente desejou conhecer a trajetória do mais antigo e tradicional estabelecimento escolar de ensino da cidade – o grupo escolar (atual escola estadual) Coronel Cruz. Nele fiz, no início da década de 1960, o 5º ano primário ao tempo da saudosa diretora Mirtes Rosa de Mendonça Lima.

Assim, cumprindo o objetivo central que norteou a criação deste blog, que é o de interagir com as pessoas e, ainda, atendendo de maneira muito prazerosa à solicitação da competente empresária paranaense, ouso publicar a nota abaixo repetindo, com as devidas e necessárias adaptações/ampliações, parte do texto referente ao décimo capítulo do meu 5º livro (Itacoatiara. Roteiro de uma cidade, segunda edição, 316 páginas), editado em 1997.

No final do século 19, após a proclamação do regime republicano no Brasil, o ensino público no Município de Itacoatiara teve ampliado o número de seus estabelecimentos escolares.

O sistema adotado no Império, pautado essencialmente nas escolas de primeiras letras, foi então substituído pelo regime de etapas, compreendendo: a) curso primário ou jardins de infância, ministrado nas chamadas escolas maternais; b) curso elementar ministrado nas escolas rurais; c) curso médio, ministrado nas escolas singulares e grupos escolares; e d) curso superior que, prioritariamente, iria funcionar nas capitais estaduais.

Posteriormente, a Lei Regulamentar de 14 de outubro de 1918 estabeleceu três anos para o curso elementar, que desenvolveria os primeiros rudimentos trazidos do curso preliminar. Ambos constituiriam o curso primário integral, compreendendo ensino de elementos da língua portuguesa, aritmética, geografia, história do Brasil, ciências físicas e naturais, desenho, ginástica sueca e trabalhos manuais.

No Estado do Amazonas o curso médio era ministrado em um ano, quer nos grupos escolares, quer nas escolas singulares das vilas e cidades.

O ano letivo começava no dia 1º de março e terminava a 31 de outubro, época em que se realizavam os exames escritos e orais, conferindo-se ao aluno aprovado com média expressiva um certificado de conclusão, possibilitando sua matrícula no curso imediatamente superior.

A Diretoria Geral de Instrução Pública e o Conselho Estadual de Instrução superintendiam todas as etapas do ensino, inclusive as de alçada das escolas particulares, igualmente sujeitas ao regime dos estabelecimentos oficiais.

Em Itacoatiara, até o ano de 1919, algumas escolas singulares, também chamadas escolas isoladas, constituíam os estabelecimentos de nível médio. O fato é que inexistia na cidade grupo escolar propriamente dito.

Embora disputando a melhor colocação no quadro escolar, antes de meados do século 20 funcionavam na cidade as escolas particulares dos eméritos professores Vicente Geraldo de Mendonça Lima (1881-1976) e Cassiano Secundo Nunes de Oliveira (1864-1932). O primeiro, cearense de Maranguape/CE, foi tabelião do Cartório do Primeiro Ofício e secretário da Intendência (atual Câmara Municipal) e da Superintendência (Prefeitura). Cassiano Secundo era filho da cidade de Alenquer/PA, agrimensor, intendente (vereador) em 1920/1922 e 1926/1930 e autor da planta topográfica da cidade de Itacoatiara – matriz do excelente traçado urbano da cidade. A escola Minerva, do professor Vicentinho Mendonça, funcionou em dependências de sua residência na Avenida 7 de setembro. (No início da década de 1990, quando redigi o anteprojeto da Lei Orgânica do Município, por encomenda da Câmara Municipal, tive a honra de fazer constar nela um artigo determinando que a Prefeitura Municipal mandasse construir no local uma escola em homenagem àquele ilustre homem público; e assim foi feito: a Escola “Vicente Geraldo de Mendonça Lima” está lá, altiva, honrando a memória do seu patrono). Já a escola do professor Cassiano Secundo ocupou o prédio histórico da antiga que mais tarde abrigou a Delegacia Geral de Polícia, nas proximidades do Hotel Serpa, onde atualmente funciona a ADEFITA.

Data de 1902 a ideia de se construir o grupo escolar Coronel Cruz. Em 18 de dezembro daquele ano, por determinação do então governador Silvério José Nery (1858-1934), foi feito o serviço de medição do prédio que futuramente sediaria o estabelecimento.

Mas, somente em 1917/1918, na administração do governador Pedro de Alcântara Bacellar (1835-1927), é que foi construído aquele que seria o primeiro prédio em alvenaria especialmente planejado para sediar um estabelecimento público de ensino em Itacoatiara. Inaugurado em 1919 (era superintendente do Município o senhor João da Paz Serudo Martins), recebeu a denominação de grupo escolar Vencesláu Brás, em homenagem ao presidente da República Vencesláu Brás Pereira Gomes (1868-1966) – que havia liberado os recursos para sua construção. O elegante edifício, em linhas clássicas, passou a sediar, a partir de 1932, a Prefeitura e a Câmara Municipal, enquanto as atividades escolares foram transferidas para o antigo prédio de madeira, onde hoje é o Serviço Autônomo de Águas e Esgotos (SAAE), ao lado da Catedral.

Coincidindo com o período de construção do grupo escolar, o sistema de ensino público amazonense passou por importantes modificações estruturais e curriculares.

Em 1923, o oficialismo local retirou do estabelecimento o nome do presidente Vencesláu, substituindo-o para grupo escolar Coronel Cruz, como era conhecido o chefe político Miguel Francisco Cruz Júnior (c.1850-c.1923), falecido à época, o qual nas últimas décadas do século 19 para começo do século 20 mandava e desmandava em Itacoatiara.

Avô paterno da famosa pianista e compositora de música erudita, falecida no Rio de Janeiro,Lindalva Cruz (1909-2005), o Coronel Cruz foi administrador/tesoureiro da Mesa de Rendas (criada pela Lei nº 755, de 01 de junho de 1887), em 1888/1889, e vereador à Câmara Municipal de Itacoatiara, nos períodos 1890/1891 e 1891/1892.

Releve-se que em 1931 a então recém-criada escola Isaac Perez, ministrada pela professora Izaurina Pinto Barreto, mudou sua denominação para Aureliano Paes de Andrade, sendo no ano seguinte encampada pelo grupo escolar Coronel Cruz.

Desde 1933/1934 ministraram aulas neste estabelecimento as professoras Maria da Costa Ferreira, Olga de Oliveira Brandão, Alayde Lima da Costa, Francisca de Menezes Fonseca (1906-1988), Olga Rego de Morais Figueiredo (1909-1991), Maria Odethe Albuquerque Silva, Izabel Rodrigues de Menezes (1911-1970), Marina Teixeira e Neusa Teixeira. Habilitadas pela antiga Escola Normal de Manaus (atual Instituto de Educação do Amazonas), após prestarem concurso público foram nomeadas pelo governador Álvaro Botelho Maia (1893-1969). Mais tarde (1942) se juntou a elas Mirtes Rosa de Mendonça Lima. Foi o período áureo da escola.

Algumas das suas mais célebres diretoras foram Inocência Vasconcelos (de 1927 a 1933); Maria da Costa Ferreira (1934); Francisca de Menezes Fonseca (de 1935 a 1945); Carmelita Cruz (1946); e Mirtes Mendonça Lima (de 1946 a 1947 e na década de 1950).

A atual sede do grupo escolar Coronel Cruz, construída de frente para a Praça da Catedral, teve o lançamento de sua pedra fundamental efetivado em 27 de julho de 1946, na Interventoria  Estadual do doutor Júlio José da Silva Nery. Já a cerimônia de sua inauguração, presidida pelo governador Leopoldo Amorim da Silva Neves (1898-1953), deu-se em março de 1948.

Nas décadas seguintes (1960/90) o prédio sofreria diversas intervenções em suas estruturas externa e interna, resultando em radical mudança no seu visual arquitetônico – o que pode ser comprovado pelo manuseio de fotografias da época.

No grupo escolar Coronel Cruz estudaram importantes figuras que engrandeceram (ou ainda engrandecem) Itacoatiara e o Amazonas, que se revelaram (ou se revelam) grandes nomes nas artes, na política, no magistério, nas ciências e na cultura em geral. Refiro aqui alguns: o jurista Vicente Mendonça Júnior (1921-2009), especialista em Direito Eleitoral, ex-procurador-geral do Estado, ex-deputado estadual constituinte em 1947/1951 e ex-presidente do Conselho Diretor da Universidade Federal do Amazonas; o tribuno João Valério de Oliveira (1928-1973), advogado, professor e jornalista, ex-secretário e vereador à Câmara Municipal (1956/1959) e deputado à Assembleia Legislativa do Estado em três legislaturas (1959/1963, 1963/1967 e 1967/1971); a professora Raymunda de Menezes Vasconcellos Dias (1908-1980), vereadora (1935/1938) e ex-presidente da Câmara Municipal, destacada como a primeira mulher brasileira a exercer um cargo público eletivo, escolhida por voto direto e secreto após a reforma eleitoral de 1934 promovida pelo então presidente Getúlio Vargas (1882-1954); o político Antônio Vital de Mendonça (1925-1955), o mártir da estrada Manaus-Itacoatiara, ex-vereador (1952/1954) e deputado estadual (1955); o médico Euler Esteves Ribeiro, doutor em gerontologia, ex-deputado federal, ex-secretário de Saúde do Estado do Amazonas, membro da Academia Amazonense de Letras e da Academia Amazonense de Medicina, e diretor da Universidade da Terceira Idade/UEA; o escritor Elson Farias, poeta e ensaísta, ex-secretário de Educação e Cultura, ex-presidente da União Brasileira de Escritores do Amazonas, ex-presidente da Academia Amazonense de Letras, membro do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas e ex-conselheiro presidente do Tribunal de Contas dos Municípios; o cientista Ozório Fonseca, escritor, pesquisador, professor da Universidade do Estado do Amazonas, professor visitante de várias universidades brasileiras e ex-diretor do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia; o médico e ex-vereador Alberto Yannuzzi Neto; o cantor e compositor Antonio Batista; o policial federal Valmir Gama Barbosa; a advogada Iracema Alencar de Queiroz e muitos outros.

Nos últimos quinze anos destacaram-se à frente do estabelecimento, como seus gestores, os professores Dilma Martins da Costa, Maria José Amazonas, Roberto Pereira de Nazaré e, de março de 2001 até hoje, Ireide Maria dos Santos Travassos. Atualmente, excluídos onze administrativos, o quadro docente compõe-se de dezoito professores, com destaque para os mestres Trindade Almeida Müller, Marlene Lima de Vasconcellos, Regina Lúcia Lisboa Pena, Virgínea Lúcia Nascimento, Juliana de Souza e Eroneide da Silva. Além dos setores de Diretoria e Secretaria, a estrutura físico-funcional da escola é composta de oito salas de aula e uma biblioteca, com um acervo superior a 3.000 livros, e atualmente gerida pela professora Kenny Marinho Isper da Silva.

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7 respostas

  1. A Pedra Pintada e Polida, da Poiésis a Canção e, agora, da “green city”, como afirma o meu amigo Saraiva até ser inclusa na era do cristal digital é uma terra cosmopolita, antevista já pelos primeiros cronistas, como berço acolhedor de todos os rítmos regionais, da profusão das cores tupyniquins e de todas as crenças planetárias que para cá vieram que, segundo Silva, pela força da caboquização se amazonificaram, fazendo dela … “querida filha do país”. Apesar de alguns estarem associados ao obscurantismo político, Itacoatiara marcha para o desenvolvimento, independentemente de quem assuma o comando… Lembro-me desse grupo quando menino, tendo como diretora dona Olga e, depois de muito tempo, de meu pai saindo à noite com o Fábio Lucena. Creio que a maioria dos habitantes da nação Itaquatiara é alegre e feliz porque a cidade cresceu de frente para a orla, respeitando a magestade do grande rio, mas vestida bem de verde como a esperança, como escreveu a poetriz, musicista e madre Rita de Cássia. Claro, só faltam demolir alguns cotôcos demagógicos de quem não respeita nosso patrimônio. Cabe a nós, encaminhar os filhos para comandá-la com ética, retidão e transparência. Fico pensando como seria a vida se não tivéssemos nascidos em teu seio. Embora alguns queimem a bandeira e rasguem teu hino, Itacoatiara voce é a síntese de todos os meus sonhos.

  2. Muito bom, estou em busca de conhecer mais sobre a história da minha família. Sou tataraneto do Coronel Cruz. Caso tenha mais informações sobre ele, agradeceria muito se pudesse me dar referências para que eu possa também tomar conhecimento.

  3. CRUZ, me diz porque a IMPRENSA AMAZONENSE e os intelectuais críticos dessa comunidade das mais importantes culturais do Brasil, não falam da Poetisa MARIA CARMELITA DE HOLLANDA CRUZ, que trabalhou para a EDUCAÇÃO amazonense de 1928 a 1950, teve sua poesias publicadas nos jornais “Folha do Acre” de 1928 e no “Commercio do Amasonas” de 1930 a 1977 e depois que seu esposo Wladimir Cruz que era da Imprensa amazonense faleceu esqueceram por completo daquela grande intelectual chegada a ser elogiada por Mário Ypyranga.

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